terça-feira, 20 de novembro de 2012

9º ano - leitura e interpretação


Duzentas gramas
       Tenho um amigo que fica indignado quando peço na padaria “duzentas” gramas de presunto — já que a forma correta, insiste ele, é duzentos gramas. Sempre discutimos sobre os diferentes modos de falar. Ele argumenta que as regras de pronúncia e de ortografia, já que
existem, devem ser obedecidas, e que os mais cultos (como eu, um cara que traduz livros) devem insistir na forma correta, a fim de esclarecer e encaminhar gente menos iluminada.
         Eu sempre argumento que, quando ele diz que só existe uma forma correta de falar, está usurpando um termo de outro ramo, que está tentando aplicar a ética à gramática, como se falar corretamente implicasse algum grau de correção moral, como se dizer “duzentas” significasse incorrer numa falha de caráter, e dizer duzentos gramas fosse prova de virtude e integridade.
          Ele vem então com aquela de que se pode desculpar a moça da padaria quando fala “duzentas”, pois ela desconhece a norma culta, mas quanto a mim, que a domino, demonstro uma falha de caráter ao ignorá-la em benefício dos outros — só para evitar o constrangimento de falar diferente. “Quem sabe fazer o bem e não o faz comete pecado” — parece concluir.
      Eu reconheço, sim, que falo de forma diferente dependendo de quem seja meu interlocutor. Às vezes uso deliberadamente formas como “tentêmo” ou “vou ir”. Pelo mesmo motivo, todas as gírias e dialetos locais me interessam. Não que — por exemplo—a decisão de dizer “duzentas” gramas seja consciente, uma premeditação em favor da inclusão social. É que, algumas vezes, a coisa certa a se fazer — sobretudo na linguagem falada — é ignorar a norma, ou pervertê-la. Quando peço “duzentas gramas de presunto, por favor”, a moça da padaria invariavelmente repete, como que para extorquir minha profissão de fé à norma inculta:
__ DUZENTAS?
— Duzentas, confirmo eu, já meio arrependido, mas caindo, ainda assim, em tentação.
                                         (Adaptado de Pauto Brabo, site A bacia das almas)

1. A posição do autor do texto em relação aos diferentes níveis de linguagem é a de quem:
a) por desconhecer a norma culta, não pode mostrar constrangimento quando não fala  corretamente.
b) por dominar a norma culta, sente-se à vontade para deturpá-la, sem que haja qualquer razão  para isso.
c) mesmo dominando a norma culta, não hesita em transgredi-la, quando isso favorece a comunicação com os outros,
d) por desconhecer a norma culta, despreza a presunção das pessoas que insistem em corrigir  quem fala incorretamente.
e) mesmo dominando a norma culta, desobedece-a sistematicamente, não importando a situação de uso da linguagem.

2. Atente para as seguintes afirmações:
I. A indignação do amigo deve-se ao fato de que o autor, que se apresenta como um homem culto, não domina as regras de pronúncia e de ortografia.
II. Para o amigo do autor, a desobediência à norma culta é sobremaneira indesculpável quando quem a infringe é aquele que não a desconhece.
III.0 autor comunga com seu amigo a convicção de que o uso da norma culta beneficia o interlocutor que ainda não a conhece.
                   Em relação ao texto, está correto o que se afirma em:
               a)I, II e III                 b) I e II, somente               c) II e III, somente
                                d) I e III, somente      e) II, somente

3. No segundo parágrafo, a argumentação do autor diante da convicção do amigo quanto ao uso da linguagem pode ser assim resumida:
a) Deve-se desculpar o pecado de quem insiste em falar ou escrever de modo incorreto.
 b) Não  se deve contundir o plano da suposta correção da norma culta como plano ético das virtudes pessoais.
c) Mesmo quem desconhece a norma culta está virtualmente habilitado para um dia vir a dominá-la.
d) Quem se vale da linguagem espontânea demonstra ser mais virtuoso do que aquele que se vale  da norma culta.
e) O desconhecimento da norma culta prejudica apenas a comunicação, mas não implica falta de  caráter.

4. De acordo com o contexto, é irônica a seguinte frase:
a) (...) caindo, ainda assim, em tentação.
b) (...) as regras de pronúncia e de ortografia (...) devem ser obedecidas (...)
c) (..j pois ela desconhece a norma culta (..)
d) (...) algumas vezes, a coisa certa a se fazer é ignorar a norma
e) (...) todas as gírias e dialetos locais me interessam.

5. Considerando-se o contexto, na passagem em que a moça da padaria pergunta “DUZENTAS?”, repetindo a palavra ouvida:
a) a atendente demonstra compartilhar a mesma indignação do amigo do autor.
b) o amigo do autor encontraria uma razão para mudar de idéia quanto às suas convicções
     linguísticas.
c) o autor demonstra seu constrangimento ao ser imediatamente corrigido por uma atendente.
d) o autor faz crer que a pergunta teria sido um pedido de confirmação da forma verbal por ele
     utilizada.
e) a atendente demonstra sua satisfação em reconhecer o esforço do autor em se valer de uma  linguagem espontânea.

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